VÍDEO: Mãe relata como 'biquinho fofo' de bebê levou a diagnóstico de autismo no interior de SP

Mãe conta como ‘biquinho’, visto como mania, revelou o autismo da filha A secretária Nathalia Costa Rodrigues, de 26 anos, lembra com clareza o momento em que percebeu algo diferente no desenvolvimento da filha, Iara Dalam, hoje com 4 anos. Há 3 anos, a família se mudou para São Carlos (SP) para buscar tratamento para a pequena diagnosticada com o Transtorno do Espectro Autista (TEA) não-verbal, suporte nível 3. (Confira abaixo) 📱 Já segue o Instagram do g1 São Carlos? Clique aqui! Os primeiros sinais surgiram cedo, e ainda com seis meses a pequena fazia 'biquinhos fofos'. Mas até aí, o trejeito parecia uma mania. (veja vídeo acima). Depois, aos oito meses, mais um alerta veio: a falta de interação. O relato da mãe sobre o sinal que antecedeu o diagnóstico de autismo viralizou e já ultrapassa 40 milhões de visualizações no Instagram. “O biquinho não passava de uma mania para mim, mas fui associar como uma estereotipia (comportamentos repetitivos) depois do diagnóstico dela. Aos oito meses, eu também chamava o nome dela mais de 10 vezes e ela não me olhava. Não buscava contato visual, não parecia interessada em interação social”, contou ao g1. Hoje, apesar de ainda fazer o “biquinho”, Iara apresenta redução significativa do comportamento repetitivo. O gesto aparece apenas em alguns momentos, como quando a mãe faz fotos dela para lojas de roupas, ocasião em que aproveita a espontaneidade da filha para registrar as imagens, já que a criança ainda não faz poses nem obedece comandos. Iara Dalam aos 6 meses fazendo o 'biquinho' e aos 4 anos posando de modelo para os olhos da mãe Nathália. Arquivo pessoal Gesto repetitivo A médica psiquiatra Marília Pessali explicou que o autismo está presente desde o nascimento e se manifesta de forma progressiva ao longo do desenvolvimento. Ela afirmou que gestos repetitivos que parecem inofensivos, como fazer biquinho, podem ser um dos primeiros sinais do TEA, mas não devem ser avaliados isoladamente. “Um gesto repetitivo pode ser um sinal precoce do autismo, mas sozinho não define o diagnóstico. O que observamos é todo o neurodesenvolvimento da criança”, disse. Segundo a médica, a atenção aumenta quando o comportamento ocorre de forma excessiva e vem acompanhado de outros sinais, como pouco contato visual, baixa resposta à voz, desinteresse por rostos e atrasos motores. Bebês muito pouco reativos ao ambiente ou, ao contrário, extremamente irritados e resistentes a mudanças também exigem um olhar mais atento. Intuição de mãe e de vó Natália lembra que o pediatra da época garantiu que era normal, mas a intuição falava mais alto. A comparação com a sobrinha, um mês mais nova, reforçou a preocupação. Enquanto a priminha atendia prontamente ao nome, Iara permanecia indiferente. "O comportamento dela me deixou apreensiva e eu comecei a pesquisar mais sobre as possibilidades, considerando também um atraso comum do desenvolvimento", disse. A mãe passou a pesquisar e observar cada comportamento e atitude que, mais tarde, seria crucial para um diagnóstico precoce. A suspeita ganhou força quando a avó de Iara, que é enfermeira, percebeu comportamentos típicos do autismo. Durante uma quermesse, a menina ficou completamente hipnotizada pela banda de forró e, especialmente, pelo triângulo tocado no palco. “Ela poderia ficar ali por horas, imersa, como se aquilo fosse o mundo inteiro”, lembrou a mãe. Outro traço marcante era a memória impressionante da criança. Mesmo com menos de 2 anos, Iara decorava caminhos com facilidade e conseguia retornar a lugares observando apenas o chão, sem levantar o olhar para reconhecer pessoas ou ambientes. Episódios como o dia em que atravessou um shopping apenas para chegar à escada rolante que tinha visto à distância reforçaram a percepção dos familiares. "Ela ama subir e descer escadas, e como é hiperativa e tem memória boa, ela sabia exatamente o caminho que deveria fazer para ir até a escada que ela gostava tanto", disse. Exame clínico Segundo a psiquiatra Marília, o diagnóstico do TEA é clínico, feito por meio da observação da criança em diferentes ambientes e da escuta da família. Não há exame específico para identificar o transtorno. “Quanto mais cedo o autismo é identificado, mais cedo as terapias podem ser iniciadas, aproveitando a maior plasticidade do cérebro na infância”, explicou Marília. Após o diagnóstico, a orientação é buscar informação e apoio profissional. As terapias variam conforme as necessidades de cada criança e tendem a ser mais eficazes quando feitas por uma equipe multidisciplinar, com participação ativa da família. Aos 1 ano e 8 meses, Nathalia buscou uma nova pediatra, que aplicou o teste M-Chat, questionário usado para apontar risco de autismo. Com pontuação alta, Iara foi encaminhada para avaliação com neuropediatra, psicóloga, fonoaudióloga, terapeuta ocupacional e equipe interdisciplinar. Enquanto aguardava vaga pelo Sistema Único de Saúde (SUS), a família iniciou investigação e intervenção precoce em uma clínica especializada em São Carlos. Foram seis meses de avaliações até que, aos 2 anos e 5 meses, o diagnóstico foi confirmado: autismo nível de suporte 3, o grau mais alto, que indica necessidade de apoio contínuo para atividades básicas. Para a família, descobrir o que a filha tinha foi um misto de alívio e receio do futuro. “A sensação foi de alívio por finalmente termos uma resposta. Mas também de medo do que estava por vir. Não choramos por negação, e sim porque entendemos que aquele seria o ponto de partida para aprender a ajudá-la", comentou. As dificuldades também se manifestavam no comportamento como a resistência em cortar unhas, escovar dentes, falta de comunicação, ausência de contato visual e brincadeiras repetitivas. Biquinhos repetitivos foram o primeiro sinal do autismo na Iara, de São Carlos (SP) Arquivo pessoal Veja os níveis de suporte do TEA: Nível 1: necessidade de pouco suporte; dificuldades sociais sutis, sofrimento com mudanças e sobrecarga sensorial. Nível 2: necessidade de suporte frequente; rigidez de comportamento, interesses restritos e dificuldades sociais evidentes. Nível 3: necessidade de apoio muito intenso; comunicação bastante limitada, pouca interação social e grande dificuldade com mudanças. Distúrbio do sono A família de Iara enfrentou também um dos maiores desafios, o distúrbio de sono severo. Após o desmame, Iara passou cerca de cinco meses acordada durante a noite, correndo, gritando e incapaz de descansar. Uma cena marcante aconteceu em um fim de semana, quando os pais, exaustos após uma noite inteira acordados, dormiram à tarde e deixaram Iara brincando. “Acordamos com o apartamento alagado. Ela tinha ligado a torneira do banheiro. Se não fosse a gata miando desesperada em cima da cama, não teríamos percebido. Mas poderia ter sido pior", contou. A situação só melhorou com medicação orientada por neuropediatra e uma rotina de sono rigidamente estruturada. Ao mesmo tempo, surgiu outro obstáculo ainda mais complexo, o da seletividade alimentar extrema. Houve meses em que a dieta de Iara se resumia a purê de batata e ovo mexido. Quando ela enjoava, a família precisava descobrir rapidamente um novo alimento que fosse aceito. Entre os poucos alimentos tolerados estão o arroz separado grão por grão, banana, batata frita, bolacha água e sal, sucrilhos e nuggets. A preocupação com a nutrição é constante. “Ela foge do que não conhece e até o que conhece, às vezes, simplesmente deixa de querer. Nada é constante”, contou Nathalia. Leia mais notícias da região: SÃO CARLOS: Mãe homenageia filho e oferece 60 cortes gratuitos de cabelo para autistas no interior de SP COMPORTAMENTO: Chás revelação de autismo viralizam nas redes sociais e acendem debate sobre diagnóstico ARARAQUARA: Mãe encontra no rock um caminho para integrar o filho com autismo: 'Lá ele pode ser quem é', diz Pequenas grandes vitórias Apesar dos desafios, os avanços começaram a aparecer com o tratamento intensivo. Iara recebeu indicação para mais de 25 horas semanais de terapias ABA, psicologia, terapia ocupacional com integração sensorial, fonoaudiologia, musicoterapia e acompanhamento nutricional. Nathalia precisou deixar a faculdade, e o marido passou a trabalhar em dois empregos para manter o tratamento. O esforço trouxe resultados concretos. Hoje, Iara já faz contato visual imediato, permanece sentada por mais de cinco minutos, brinca de forma funcional, canta músicas infantis e imita sons e palavras. Ela ainda é não verbal, mas já emite vocalizações que mostram o caminho para a comunicação. Já imita o que os pais falam, e está aprendendo a se comunicar. “Hoje, o que mais me emociona é ver ela nos imitando e repetindo o que falamos. Aos poucos, a comunicação verbal está começando, e ouvir a Iara cantarolar as musiquinhas que conhece é uma conquista muito esperada por nós”, contou a mãe. Na creche, Iara ainda prefere ficar em seu próprio cantinho, brincando com quebra-cabeças e livros. A socialização com crianças é limitada, mas já não provoca crises como no início, o que é uma grande vitória. A pequena Iara gosta de ser fotografada pela mãe em seus lookinhos fashions Arquivo pessoal Planos futuros A vivência transformou a vida de Nathalia, que agora planeja estudar psicologia para compreender melhor o funcionamento do cérebro da filha e ajudar outras crianças. “É o caminho que quero seguir. A maternidade atípica virou também meu propósito.” Ao falar com outras mães que começam essa jornada, o recado é de muito afeto e coragem. “Não se culpem pelo autismo. Aceitar o diagnóstico é um ato de amor. A intervenção precoce muda tudo. E cuidem-se, porque a maternidade atípica pode ser solitária, e essa solidão machuca tanto quanto ver nossos filhos em crise", recordou. Nathalia diz que, apesar de todas as dores, a maternidade atípica trouxe descobertas profundas, pequenas vitórias enormes e um amor que se reinventa diariamente. “A maternidade atípica não é menos, nem pior. É diferente. E dentro dessa diferença existe uma força imensa e uma beleza que transforma", finalizou. REVEJA VÍDEOS DA EPTV CENTRAL: Veja mais notícias da região no g1 São Carlos e Araraquara Veja mais notícias da região no g1 São Carlos e Araraquara